Em um aterro sanitário do Jardim Gramado, em Duque de Caxias,sobrevive ESTAMIRA , uma mulher marcada pela dor , pelo consciente e inconsciente , pelo desprezo e , como ela mesma relata ,“com a missão de revelar a verdade, somente a verdade”.Tal personagem , através dos seus constantes “delírios críticos” e ínfimos momentos de sobriedade , deixa transparecer as intimas condições físicas, psíquicas e sociais vivenciadas pelos moradores dos aterros sanitários , trazendo a tona não só uma realidade local, mas um condição presente em todas as regiões no Brasil.
Como um dos temas retratados tem-se o desperdício, motivado por um padrão consumista, que induz à criação de cidadãos desinteressados com o bem coletivo. Tal fato leva à produção desenfreada e ao acúmulo, cada vez mais freqüente nas grandes cidades, de um lixo utilizado por uma população que orbita em torno de locais à procura de comida, vestuário, materiais para a construção de moradias paupérrimas e de trabalho. A exemplo, tem-se o lixão da Muribeca, no Recife, que comporta diariamente mais de 1200 cidadão que catam, em média, 2400 toneladas de lixo por dia, demonstrando o cruel paradoxo social de uma cidade que não é capaz de assegurar uma condição digna de trabalho, moradia e perspectiva de vida para todos.
Outro assunto de fundamental importância, relatado nesse documentário, refere-se ao abuso sexual sofrido pelos catadores. As maiores vítimas são do sexo feminino, uma vez que, desprotegidas em suas próprias residências e obrigadas a desbravar as noites e os dias em locais insalubres, terminam tornando-se vulneráveis aos agressores, seres incapazes de respeitar a dignidade do outro, e que, em alguns casos, contaminam suas vítimas, com doenças sexualmente transmissíveis e provocam transtornos e lesões emocionais irreparáveis. Como paradigma, tem-se o relato da filha de ESTAMIRA, Carolina, ao descrever as cenas de tortura física e desprezo humano sofrido por sua mãe, ao ser estuprada duas vezes no centro da cidade .
Os problemas relatados anteriormente, não apenas marcam a vida dessas pessoas, mas refletem no aumento de investimentos em profissionais destinados à minimização de doenças de caráter neurofisiológico e na compra de medicamentos para o tratamento adequado do paciente carente . Além das citadas observações, ao longo do filme é notória uma crítica veemente ao descaso médico, no seu processo de atendimento. Muitos profissionais de saúde tratam os pacientes como uma máquina fisiológica, não correlacionando o seu contexto social aos problemas apresentados e desrespeitando a necessidade de tratamentos compatíveis com a realidade de cada cidadão. Esse cenário norteia a temática final do documentário e a vida real desses moradores e trabalhadores de lixões.
Enfim, como todo filme que retrata uma realidade social marcada pelo determinismo, no qual o homem é tido como um mero produto do meio, ESTAMIRA cheira à revolta, à descrença (“Que Deus é esse?” “Só pra otário, pra esperto ao contrário, bobado, bestalhado ...”Quem andou com Deus dia e noite, noite e dia na boca ainda mais com deboches , largou de morrer ?” ....) e a lixo , o “lixo de pessoas” que a sociedade ajuda a criar todos os dias .
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Achei ótima a associação com a situação do aterro sanitário de Recife. parabéns ao grupo.
ResponderExcluirMariana Olívia
Realmente foi muito boa a iniciativa de mostrar os graves problemas que afligem a população. Meus parabéns à turma 93.
ResponderExcluirBruno Duarte (Carioca)